sexta-feira, 30 de janeiro de 2009

cap 2: 7 de janeiro - Chegando em Lima - Perú

Fazia exatamente dez anos e um mês que não entrava em um avião. A última vez havia sido em dezembro de 1998, quando voltei do Japão em um longo voo de mais de 32 horas (Tokyo, Seattle, Miami, São Paulo). Eu havia morado lá por quase um ano, trabalhando em um hotel. Qualquer dia, talvez, eu conte aquela viagem. Só sei que enquanto esperava pelo voo TAM JJ 8066 no portão de embarque número 2 em Guarulhos, confesso que estava um pouco nervoso. Aviões são ótimos meios de transportes, comparavelmente muito mais seguros do que ônibus e carros, mas...

Um peruano (ou ao menos parecia peruano) dedilhava um violão. Algumas crianças estrangeiras, loiras e branquinhas, brincavam de subir nas cadeiras e pular, gritando em inglês. Um casal alemão, com mochilas enormes, junto a um crescente número de pessoas, também aguardavam o chamado para o embarque. Ele veio por volta das 7:30 da manhã. Respirei fundo, dei adeus ao Brasil e embarquei na poltrona 18F do Airbus A320, para minha viagem São Paulo-Lima, sem escalas.

Meu nervosismo era infundado. Sim, é meio assustador quando a aeronave pára no início da pista e parte, como um carro de "dragster", a trezentos quilômetros por hora. Você fica olhando pela janelinha a pista passar, passar, passar....e nada do avião subir, aparentemente até o último metro possível, quando as 160 mil toneladas do A320 finalmente se levantam do solo e começam sua jornada pela atmosfera. E então é aquele curioso espetáculo de cruzar as nuvens e ver o mundo lá de cima. Nessa era de Google Maps e Google Earth, não deixa de ser engraçado perceber que nossa percebção de mundo mudou; já não é mais assim tão estranho ver o mundo lá embaixo. De qualquer forma, o tamanho descomunal da cidade de São Paulo impressiona, não importa a altitude em que se esteja. O voo partiu por volta das 8:30 da manhã de Cumbica e estava programado para chegar às 10:30 da manhã, horário local, no Perú. Só que há três horas de diferença (para menos) entre o horário de Lima e o de Brasília, de modo que a viagem, na verdade, teria duração de aproximadamente cinco horas.


Grande parte deste tempo eu passei, qual criança, de olho na paisagem lá fora. É verdade que chega uma hora que a sucessão de campos verdes, entrecortados por estradas ou rios fica cansativa. O caso é que, após acordar de uma cochilada rápida, tudo havia mudado lá fora. A paisagem verde foi substituída por tons de cobre, marrom e areia. Claramente já não voava sobre o Brasil. A bem da verdade, parecia mais que estava sobre o planeta Marte! Era mais provável que sobrevoasse a parte oeste da Bolívia ou mesmo o Perú. Por todo o avião ouvia rumores e comentários entusiasmados dos outros passageiros. Até que o avião chegou ao Pacífico, virou à direita e começou a subir a costa, em direção de Lima. Assim, do meu lado do avião podia ver a paisagem "marciana", enquanto do lado esquerdo os passageiros viam o azul do mar. Este contraste entre água e terra seca eu veria novamente alguns dias mais tarde, quando parti de Lima.
Falando em Lima, finalmente lá estava ela. Cidade grande, com 11 milhões de habitantes, Lima é a capital do Perú, antiga capital do Vice Reino, durante o período da Colonização Espanhola. Sua posição geográfica, a oeste dos Andes, e algumas condições atmosféricas especiais produzem um fato interessante: não chove na cidade há anos. Do alto, Lima me parecia alguma cidade do deserto africano. Tudo muito seco, milhares de casas, ruas e estradas aparentemente cobertas por uma poeira avermelhada. O sinal de apertar o cintos do avião se acendeu e o piloto, em espanhol (e em algo que ele achava que era inglês) avisou a tripulação para se preparar para a aterrisagem e, novamente, comecei a imaginar se não teria sido melhor vir de ônibus, trem, cavalo... qualquer coisa menos naquela máquina que virava de um lado para outro, por sobre o Pacífico, se preparando para pousar. O avião circulou por uma grande baía e vi vários tipos de barcos lá embaixo. Finalmente, começou a descer de verdade até tocar, com muito mais leveza do que estava esperando, o solo peruano.
Havia chegado a Lima.

cap 1: Antes de partir

Seis e cinquenta da manhã. Cumbica, Guarulhos. Havia acordado às quatro da manhã, em Vinhedo, para ligar para a Viação Caprioli, em Campinas, para avisar que eu iria pegar o ônibus das quatro e meia da manhã para Cumbica. Bagagem em punho, meu pai me deu uma carona até o posto gasolina do Lago Azul, na Anhanguera, para esperar pelo ônibus. Ele chegou quase cinco da manhã, cheio, e lá fui eu para a primeira etapa da minha viagem. Viagem que, por pouco, não aconteceu.

Como disse no primeiro post, ir a Machu Picchu havia sido um sonho por vários anos de minha vida. Mas havia sempre algo a me "segurar" e me "impedir" de ir. Havia a questão financeira e os preços relativamente altos dos pacotes impressos nas revistas de viagem. Eu era casado, depois veio um filho pequeno... fatos da vida que nos fazem, por vezes, deixar os sonhos "esquecidos" para se concentrar em coisas mais práticas.


Mas não agora. Estava separado fisicamente da ex-esposa há anos. Mentalmente, o ponto final chegou um pouco mais tarde, mas finalmente chegou. O filho já estava com sete anos, enorme, "independente". A questão financeira, analisando melhor e esquecendo os pacotes das revistas, se mostrou não tão complicada assim. E, finalmente, a última barreira, a mental. Machu Picchu é um lugar real, não é um devaneio da imaginação ou uma civilização extraterrestre. Ela está lá, no topo dos Andes. Grosso modo, a única coisa que você deve fazer, se quiser ir até lá, é levantar e partir. Era chegada a hora.


A não ser que os trâmites burocráticos pudessem impedir. No final de 2008, viagem praticamente decidida na cabeça, surgiu uma dúvida: é necessário passaporte para viajar ao Perú? Se você por acaso está pensando em ir ao Perú e achou este blog no Google, deixe-me esclarecer uma coisa de uma vez por todas: NÃO é necessário passaporte para ir ao Perú. Repito: não é necessário. Mas aparentemente ninguém conseguia me dar uma resposta definitiva sobre isso. Meu passaporte estava vencido fazia alguns anos e, final de ano, a burocracia para tirar outro iria demorar demais. Em Campinas, onde trabalho, estavam agendando entrega de documentos apenas para o final de janeiro de 2009. Então me sugeriram tentar em Piracicaba, que estaria emitindo ainda o modelo antigo, teoricamente mais rápido, de passaporte. Preenchi os formulários pela internet e, mesmo lá, consegui agendar a entrega de documentos somente para o dia 5 de janeiro de 2009. Um site de mochileiros para onde enviei um email perguntando não me aconselhava viajar sem passaporte. O próprio consulado do Perú me dizia que o RG oficialmente podia ser suficiente, mas que na prática eu enfrentaria toda sorte de problemas.


Já havia praticamente desistido da viagem durante as festas de final de ano. Passou o Natal, o Ano Novo e eu já estava achando que passaria minhas férias em alguma praia mesmo. Até que em um fórum do orkut li o relato de uma garota que havia feito a mesma viagem que eu queria fazer apenas com RG. Enviei uma mensagem para ela, que me confirmou tudo. De repente, a viagem parecia novamente possível. Mas como teria no máximo quinze dias para realizá-la, resolvi deixar de lado meus planos mais aventureiros, que envolviam ir de ônibus até Corumbá, em uma viagem de 20 horas, para depois atravessar toda a Bolívia antes de chegar ao Perú e tentar encurtar um pouco as coisas por via aérea. Após muito fuçar na internet e conversar com o telemarketing da TAM, comprei uma passagem de avião que partiria de São Paulo dia 7 de janeiro até Lima, Perú. De lá eu faria a viagem contrária, por terra, em direção ao Brasil. Mas como uma passagem só de ida custava praticamente o mesmo que uma de ida e volta, marquei a passagem de volta para o dia 22 de janeiro, partindo de Santa Cruz de La Sierra, Bolívia.


Dia 5 de janeiro, como já estava marcado, ainda fui a Piracicaba entregar os documentos para meu novo passaporte, que só ficaria pronto dia 13 de janeiro. Novamente houve desencontro de informações, mesmo na Polícia Federal, sobre a necessidade ou não de passaporte para entrar no Perú. O rapaz que me atendeu me disse que a Argentina até aceitava RG, mas ele teria que ser bem recente, com no máximo cinco anos de emissão. Com a pulga atrás da orelha, resolvi ir ao Poupa Tempo de Campinas para tirar um RG novo em folha, o que me custou boa parte dos dias cinco e seis de janeiro.


Assim, dia sete de janeiro, com RG novo, sem passaporte e mochila nas costas, lá estava eu no Aeroporto de Cumbica.


(continua na próxima edição)

quinta-feira, 29 de janeiro de 2009

Prólogo: Felicidade compartilhada, ou "O que é este blog?"

Olá. Meu nome é João Solimeo, sou editor de imagens e trabalho na PUC-Campinas. Basicamente meu trabalho consiste em editar matérias e telejornais para os alunos de Jornalismo, comerciais para Publicidade, institucionais para Relações Públicas, etc.

O que é o "15 Dias pelo Perú e Bolívia"? Recentemente voltei da viagem descrita no título. Foi minha primeira viagem sozinho pela América do Sul. Uma viagem que começou como uma idéia na cabeça anos atrás: "Um dia eu vou à Machu Picchu". No final de 2008, após um ano cansativo mas proveitoso no trabalho e algumas definições na minha vida pessoal, resolvi pôr em prática o sonho e partir para o Perú. A princípio seria uma viagem mais no estilo "mochileiro", feita inteiramente por via terrestre, mas acabou contando com uma parte aérea. O que não significa que não tenha passado por aventuras. Fui sozinho e sem um roteiro muito definido. Não houve auxílio de agências de viagem ou de intermediários. Na minha mochila (pequena), havia apenas duas calças jeans, cinco camisetas, sete cuecas e algumas meias. Levava dinheiro em uma carteira amarrada ao cinto da calça do lado esquerdo e, em uma bolsa masculina pendurada de atravessado no peito, minha fiel Cybershot H-10, três baterias, quatro cartões de memória (num total de 8 Gb de espaço para fotos), um caderno para anotações e uma caneta. E era isso.

Como vai ser organizado este blog? Sinceramente, ainda não sei. Só sei que tenho vontade de dividir com vocês minhas experiências nestes incríveis 15 dias de viagem. Sei também que tirei aproximadamente 2.700 fotos, algumas das quais serão usadas para ilustrar este blog. Aviso também que gosto MUITO de escrever, e gosto de escrever MUITO. Para quem já conhece minhas críticas de cinema, isso não é novidade. Sem dúvida, este é um dos motivos para me fazer voltar à faculdade, aos quase 37 anos de vida, para estudar jornalismo. "A felicidade só é real se for compartilhada", escreveu Alexander Supertramp no filme "Na Natureza Selvagem". Um dos possíveis nomes para este blog, aliás, era exatamente este: felicidade compartilhada.

Compartilhem, assim, meu relato, e façam bom proveito.